ARIÈS COM FERENCZI: REFLEXÕES SOBRE A MORTE E O MORRER DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19 NO BRASIL

Este estudo, de natureza teórica, tem como objetivo apresentar reflexões sobre a morte e o morrer durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Para tanto, em um primeiro momento nos referenciaremos, principalmente, nas proposições do historiador e sociólogo francês Philippe Ariès para sintetizar algumas atitudes frente à morte e ao morrer nas sociedades ocidentais em períodos históricos prévios. Na sequência, lançaremos mão de aportes oriundos da Psicanálise, mais especificamente daqueles estabelecidos pelo médico e psicanalista húngaro Sándor Ferenczi, para problematizar certas vicissitudes do campo social no contexto pandêmico do país. Defendemos que Bolsonaro e outras autoridades públicas alinhadas a seu posicionamento ideológico neoliberal demonstraram cinismo, ironia e frieza ante o sofrimento daqueles que perderam um ente querido na pandemia de Covid-19. Enquadramos tal fato como uma radicalização – pautada pelo exercício da necropolítica – da interdição da morte descrita por Ariès, e também como um exemplo do que Ferenczi entende como desmentido, ou seja, um abandono na forma de um não reconhecimento traumatizante. A partir do panorama histórico traçado por Ariès, notabiliza-se a excepcionalidade das atitudes frente à morte e ao morrer assumidas por uma expressiva parcela da população brasileira na pandemia de Covid-19. Por outro lado, o recurso a Ferenczi elucida o background intersubjetivo que contribuiu para a conformação dessa excepcionalidade.